"Convite para uma chávena de chá de jasmim"


quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Miss this Chef :)


Sete Sapatos Sujos

O que é que nos separa desse futuro que todos queremos? De onde vem a dificuldade de nos pensarmos como sujeitos da História?À porta da modernidade precisamos de nos descalçar. Eu contei sete sapatos sujos que necessitamos deixar na soleira da porta dos tempos novos.






Primeiro sapato:
A ideia que os culpados são sempre os outros e nós somos sempre vítimas.

Segundo sapato:
A ideia de que o sucesso não nasce do trabalho.

Terceiro sapato:
O preconceito de que quem critica é um inimigo.

Quarto sapato:
A ideia que mudar as palavras muda a realidade.

Quinto sapato:
A vergonha de ser pobre e o culto das aparências.

Sexto sapato:
A passividade perante a injustiça.

Sétimo sapato :
A ideia de que para sermos modernos temos que imitar os outros.

Na realidade, só existe um modo de nos valorizarmos: é pelo trabalho, pela obra que formos capazes de fazer. É por isso que vale a pena aceitarmos descalçar não só os setes mas todos os sapatos que atrasam a nossa marcha colectiva. Porque a verdade é uma: antes vale andar descalço do que tropeçar com os sapatos dos outros.


Mia Couto: Oração de Sapiência na abertura do ano lectivo no ISCTEM
Imagem: Sapatos de Auschwitz

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Com a força e dignidade de todas as legiões


Em Março deste ano, António Lobo Antunes, 65 anos, entrou no Hospital de Santa Maria com o manuscrito em que trabalhava debaixo do braço. E dali já não saiu. A notícia, brutal, de que tinha um cancro, chegaria pouco tempo depois. No mês seguinte, após ter sido operado, escreveu na VISÃO uma crónica na qual revelou o inferno que estava a viver. Agora, seis meses passados, o escritor lança O Meu Nome É Legião e, pela primeira vez, conta o que viu e o que sentiu.



Na minha ideia, O Meu Nome É Legião era por isso um livro de amor. De amor por uma geração, por uma classe social sozinha e abandonada, por um grupo de pessoas desesperadamente à procura de uma razão de existir.

É óbvio que dou muito mais importância aos livros do que às crónicas (...) estas são antes a possibilidade de poder fazer uma espécie de itinerário paralelo. Como quando, em miúdo, andava com o meu avô em estradas paralelas à via férrea, ficando com a sensação de viajar, ao mesmo tempo, no automóvel e no comboio.

Não sei se os leitores entenderão que o livro está a transbordar de amor. Custou-me muito que aquelas personagens morressem. Sempre me comoveu ver o desamparo em que as pessoas vivem. Acho que esta dimensão nunca foi suficientemente notada nos meus livros. Vivemos num certo desamparo, numa certa desprotecção.


Aprendi a admirar as pessoas do meu País. E a respeitá-las ainda mais. E a amá-las ainda mais. E a gostar cada vez mais delas. A partir daí, tudo o resto se tornou relativo. Houve coisas que deixaram de ser importantes. E normalmente é quando elas deixam de ser importantes que vêm ter connosco... O que me interessa, neste momento, é poder ter tempo para escrever, viver o suficiente para conseguir acabar o meu trabalho sem decepcionar os que acreditam em mim.

É claro que tomei consciência da minha finitude, porque todos vivemos em função de eternidades. Uma pessoa de 20 anos pensa que tem à sua frente 50 anos e, para ela, esses 50 anos não vão passar nunca. A minha mãe, por exemplo, vive em função de eternidades de seis meses. E, na prática, esses seis meses são tão compridos como os 50 anos do jovem de 20 anos. Quando a Maria Antonieta pedia ao carrasco «só mais um minuto, senhor carrasco», para ela aquele minuto era eterno.

Não gosto de pessoas amargas porque são mal agradecidas. A ingratidão é o pior sentimento que pode existir.

Há coisas que já não faço. Já não minto. Já não componho o perfil. Estou aqui diante de vós, nu e desfigurado. Porque a nudez desfigura sempre. Agora, jogo com as cartas abertas. Agora, jogo póquer com as cartas viradas para cima. Agora, já não há nada escondido, está tudo à vista. E ou a mão ganha ou perde. Nos livros, também já não há truques. São livros que não devem nada a ninguém. Não se nota ali a voz de ninguém, não há ali influência de qualquer outro autor. Nada. Zero. É a minha voz inteira. E a conquista da minha própria voz foi talvez o mais importante que me aconteceu. Não há ninguém a atravessar-se no meu caminho. Se não nos medimos com os melhores, não vale a pena medirmo-nos.


Não é ver a morte à minha frente, é vê-la dentro de mim. Já está cá, é uma parte de nós. E é mais fácil do que se pensa, não requer coragem, apenas dignidade e elegância. Perguntava muitas vezes: tenho-me portado de uma maneira digna?


Não há nada de mais horrível do que a cobardia. Compreendi a frase de Hemingway, quando quiseram saber o que é que ele achava da morte e a resposta dele foi: «Outra puta.» Porque a morte é sempre uma puta e, a uma puta, não se pode dar confiança. Uma amiga, que é minha médica, disse-me: «Tens que aprender a viver com isto.» Não, não tenho. Não tenho que viver com um filho da puta. Eu não vivo com um cabrão, quero destruí-lo, não quero viver com ele.

Quando ia às sessões de radioterapia, encontrava pessoas de todas as idades. Lembro-me sobretudo de uma rapariga de 20 anos que usava uma cabeleira postiça. Percebia-se logo que a cabeleira era postiça, mas ela usava-a com tanta dignidade que era como se fosse uma coroa. Uma coroa de rainha. E era, de facto, uma rainha que ali estava.

O mundo nunca cai em cima de ninguém. Naquele momento, só pensei nos livros. O que vai acontecer aos livros? Levei o que andava a escrever para o hospital, mas não tinha forças para trabalhar. Queria fazê-lo, mas não conseguia. E não queria deixar o livro inacabado porque, no meu caso, um livro inacabado é um livro cheio de redundâncias, de inutilidades e toda aquela ganga que se escreve.


Como sentiu a reacção dos leitores à sua Crónica do Hospital?
Não sabia que havia tanta gente que gostava de mim.

Sentiu-se menos desamparado?
Não, senti que não merecia tanto afecto.

Antes pedia para ver se a morte era boa consigo...
Sim, para ver se ela tinha pena de mim. Agora, já não preciso de pena.





Sara Belo Luís in Visão

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Good Morning

Achei este poema tão
belo... que não resisti a fazer o link :)

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

La rhinocérite..aujourdhui

26.11.2007 - 15h58 Reuters

Gillian Gibbons, uma professora inglesa de 54 anos radicada no Sudão, foi presa pelas autoridades sudanesas, sob acusação de ter deixado a sua turma do 2º ano baptizar um urso de peluche com o nome de Mohammed. Este exercício foi considerado “um insulto” ao profeta muçulmano e poderá valer a Gillian até três meses de prisão.


Se Jô Soares fosse português que seria da sua personagem "Sócrates, o macaco"? Estaria num exercício "dialéctico" com a PSP - leia-se Portable PlayStation - ou a cantar "Saliva" com GNR - leia-se Grupo Novo Rock .


26.11.2007 - 19h09 AFP

“Os Estados Unidos asseguraram que a força multinacional permanecerá no Iraque sob mandato da ONU apenas até ao final de 2008”, afirmou Maliki num discurso emitido na televisão nacional Al-Iraqiyah.
A declaração e a reiteração não deveriam ser, no mínimo, conjuntas? "Acaso serei EU ... guardião de meu IrmONU?"


26.11.2007 - 15h58 AFP

O Presidente sérvio, Boris Tadic, reiterou hoje a recusa de Belgrado de uma eventual independência do Kosovo. A posição do chefe de Estado foi firmada na abertura das últimas negociações para definir um estatuto para a província sob administração das Nações Unidas desde 1999.

Moscovo já tem feira para milionários
26.11.2007
Fonte: Reuters

Para além de Moscovo, só Nova Iorque tem mais milionários. É a pensar nisso que as grandes marcas começam a inundar o mercado russo com produtos de luxo.

in Público.pt



A Morte de Actaeon

Primeiro o teu neto entre todos tesouros, Cadmo,
foi causa de luto com cornos estranhos na fronte;
e vós, ó cães; saciados no sangue do dono;
mas se bem consideras o crime talvez da Fortuna,
ultraje não há; pois como haveria ultraje num erro?
(...)
A matilha com sede de sangue,
persegue a presa em escarpas, rochedos abruptos,
por trilhas difíceis ou trilha nenhuma, persegue.
Foge por onde fez tanto gritar, perseguido pelos que fez perseguir,
E queria gritar:" Eu sou Actaeon! Vede: sou vosso dono!"
palavras não atendem a intenção; latidos ressoam no éter.
(...)
Preso o dono por eles,
juntam-se os cães e rompem-lhe a carne do corpo,
em que já não cabem feridas; geme num som que,
humano não é nem de cervo também.
Lamentos preenchem as colinas que tão bem conhece,
e como se suplicasse, de joelhos, rogando,
move seus olhos à volta, sem braços que possa estender.
Os amigos incitam a matilha com gritos,
tudo ignoram e atiçam,e então buscam Actaeon,
não o vêem e chamam aos brados Actaeon,
que ao som desse nome volta a cabeça.
Queixam-se todos de lá não estar e de perder,
por preguiça, o espectáculo da presa que pegam.
Ausente quer estar mas não está; queria ver, somente,
sem sentir, a fúria de seus cães ferozes.
Em torno se agitam, mandíbulas rasgam seu corpo,
dilaceram o dono na imagem mentida de cervo,
e Diana tampouco aplacou sua ira, como se diz,
até que feridas demais lhe tiraram a vida.


Ovídio - Metamorfoses, III

Ionesco: 26.11.1909

Nous sommes prisonniers à la fois de nos cultures et de nos organismes, et il faudrait chercher, s'il y en a, des vérités plus profondes, des au-delà de cela.

28.03.1994

Ionesco: ...Ich reise ab. Ich reise gerne ab.

Wickert: Gibt es einen psychologischen Grund, warum sie so gerne abreisen, einfach weggehen?

Ionesco: Ja, das ist eine psychologische Frage. Ich habe einfach Lust, anderswo hinzugehen, zu fliehen. Wenn ich zu Hause bleibe, habe ich den Eindruck, daß mir größere Gefahren drohen, als wenn ich herumreise. Ich liebe das Abreisen. Ein französischer Dichter hat gesagt, Abschied nehmen heißt ein wenig sterben. Ich sehe das umgekehrt: Weggehen heißt ein wenig leben. Also reise ich ab.


Wickert: Ist es Ihnen eigentlich egal, wohin sie reisen. Ist nur wichtig, daß sie reisen?

Ionesco: Einfach abreisen, neue Orte kennenlernen. Es macht mir Freude, Menschen zu begegnen. Ich unternehme viel, sehe mir Ausstellungen an, schreibe auch in einem Hotel in St. Gallen, lerne Menschen, lerne neues kennen. Ich habe das Gefühl, wenn ich auf Reisen bin, daß die Welt neu wird, ganz frisch, jungfräulich. Immer bin ich auf der Suche nach der neuen Welt.. Ärgerlich ist nur, daß man nichts neues mehr entdeckt.
Ich war einmal in Israel, da fragte mich der Landwirtschaftsminister, der gegen die Wüste ankämpfte, um etwas Land zu gewinnen: 'Was hat Ihnen hier in Israel am meisten gefallen?' Ich habe dem Minister ganz dumm geantwortet: 'Die Wüste.' In den Großstädten findet man die Wüste, aber eine lärmende Wüste. Ich suche eine wirkliche Wüste, die Einsamkeit.


Wickert: Warum suchen sie die Einsamkeit?
Ionesco: In der Einsamkeit finde ich den Menschen. In den Massen kann ich ihn nicht mehr finden. Es gibt Einzelgänger, die wirklich isoliert sind, und es gibt Pseudo-Einsame.


Wickert: Wo stehen sie? Welche Art von Einzelgänger sind Sie?
Ionesco: Ich versuche, ein wirklicher Einzelgänger zu sein, aber zwangsläufig bin ich es nicht. Ich stehe in Kontakt mit allen möglichen Welten, den Zeitungen und den Massenmedien. Denn, wie gesagt, das Ich ist letztlich nicht von den anderen getrennt. Es begegnet den anderen in sich selbst.



Wickert: Sind sie Pessimist?
Ionesco: Ich kann nicht behaupten, daß ich pessimistisch wäre. Ich sage nur, daß ich erstaunt und erstaunt, entsetzt und entsetzt bin. Und ich frage mich, wie lange das alles noch dauern wird. Das ist die Hölle. Die Hölle ist die Dauer. Die Hölle ist die Wiederholung. Die Hölle dauert lange, die Ewigkeit hingegen nur einen Augenblick. Die Ewigkeit ist außerhalb der Zeit.



Wickert: Da sind sie fröhlich. Sie zeigen zwar die Zerstörung der Kommunikation, der Sprache, aber sie tun es mit Spaß.
Ionesco: Ja, leichtsinnig, unbekümmert, als wäre es ganz normal. Damals war ich auch noch jung.
Wickert: Waren sie fröhlich?
Ionesco: Nein, fröhlich bin ich nie gewesen. Das Schreiben macht mich glücklich.

La rhinocérite est partout ...


" L'homme... Ne prononcez plus ce mot ! "
Dans la ville, la rhinocérite gagne peu à peu. Bérenger, venu annoncer à Jean la contamination d'un de leurs collègues, M. Boeuf, constate que son ami devient " de plus en plus vert ".

BÉRENGER.
Laissez-moi appeler le médecin, tout de même, je vous en prie.
JEAN.
Je vous l'interdis absolument. Je n'aime pas les gens têtus (Jean entre dans la chambre Bérenger recule un peu effrayé, car Jean est encore plus vert, et il parle avec beaucoup de peine Sa voix est méconnaissable.) Et alors, s'il est devenu rhinocéros de plein gré ou contre sa volonté, ça vaut peut-être mieux pour lui.
BÉRENGER.
Que dites-vous là, cher ami ? Comment pouvez-vous penser.
JEAN.
Vous voyez le mal partout. Puisque ça lui fait plaisir de devenir rhinocéros, puisque ça lui fait plaisir ! Il n'y a rien d'extraordinaire à cela.
BÉRENGER.
Évidemment, il n'y a rien d'extraordinaire à cela. Pourtant, je doute que ça lui fasse tellement plaisir.
JEAN.
Et pourquoi donc ?
BÉRENGER.
Il m'est difficile de dire pourquoi. Ça se comprend.
JEAN.
Je vous dis que ce n'est pas si mal que ça ! Après tout, les rhinocéros sont des créatures comme nous, qui ont droit à la vie au même titre que nous !

BÉRENGER.
À condition qu'elles ne détruisent pas la nôtre. Vous rendez-vous compte de la différence de mentalité ?
JEAN, allant et venant dans la pièce, entrant dans la salle de bains, et sortant.
Pensez-vous que la nôtre soit préférable ?
BÉRENGER.
Tout de même, nous avons notre morale à nous, que je juge incompatible avec celle de ces animaux.
JEAN.
La morale! Parlons-en de la morale, j'en ai assez de la morale, elle est belle la morale ! Il faut dépasser la morale.

BÉRENGER.
Que mettriez-vous à la place ?
JEAN, même jeu.
La nature !
BÉRENGER.
La nature ?
JEAN, même jeu.
La nature a ses lois. La morale est antinaturelle.
BÉRENGER.
Si je comprends, vous voulez remplacer la loi morale par la loi de la jungle!
JEAN.
J'y vivrai, j'y vivrai.
BÉRENGER.
Cela se dit. Mais dans le fond, personne...
JEAN, l'interrompant, et allant et venant.
Il faut reconstituer les fondements de notre vie. Il faut retourner à l'intégrité primordiale.
BÉRENGER.
Je ne suis pas du tout d'accord avec vous.
JEAN, soufflant bruyamment.
Je veux respirer.
BÉRENGER.
Réfléchissez, voyons, vous vous rendez bien compte que nous avons une philosophie que ces animaux n'ont pas, un système de valeurs irremplaçable. Des siècles de civilisation humaine l'ont bâti!…
JEAN, toujours dans la salle de bains.
Démolissons tout cela, on s'en portera mieux.
BÉRENGER.
Je ne vous prends pas au sérieux. Vous plaisantez, vous faites de la poésie.
JEAN.
Brrr...
(Il barrit presque.)
BÉRENGER.
Je ne savais pas que vous étiez poète.
JEAN, (Il sort de la salle de bains.)
Brrr...
(Il barrit de nouveau.)
BÉRENGER.
Je vous connais trop bien pour croire que c'est là votre pensée profonde. Car, vous le savez aussi bien que moi, l'homme...
JEAN, l'interrompant.
L'homme... Ne prononcez plus ce mot !

BÉRENGER.
Je veux dire l'être humain, l'humanisme…
JEAN.
L'humanisme est périmé! Vous êtes un vieux sentimental ridicule (Il entre dans la salle de bains.)
BÉRENGER.
Enfin, tout de même, l'esprit...
JEAN, dans la salle de bains.
Des clichés! vous me racontez des bêtises.

BÉRENGER.
Des bêtises !
JEAN, de la salle de bains, d'une voix très rauque difficilement compréhensible.
Absolument
.
BÉRENGER.
Je suis étonné de vous entendre dire cela, mon cher Jean! Perdez-vous la tête ? Enfin, aimeriez-vous être rhinocéros ?
JEAN.
Pourquoi pas ! Je n'ai pas vos préjugés
.
BÉRENGER.
Parlez plus distinctement. Je ne comprends pas. Vous articulez mal.
JEAN, toujours de la salle de bains.
Ouvrez vos oreilles !
BÉRENGER.
Comment ?
JEAN.
Ouvrez vos oreilles. J'ai dit, pourquoi ne pas être un rhinocéros? J'aime les changements.
BÉRENGER.
De telles affirmations venant de votre part... (Bérenger s'interrompt, car Jean fait une apparition effrayante. En effet, Jean est devenu tout à fait vert. La bosse de son front est presque devenue une corne de rhinocéros.) Oh! vous semblez vraiment perdre la tête (Jean se précipite vers son lit, jette les couvertures par terre, prononce des paroles furieuses et incompréhensibles, fait entendre des sons inouïs.) Mais ne soyez pas si furieux, calmez-vous ! Je ne vous reconnais plus.


Eugène Ionesco: Rhinocéros (1959)

domingo, 25 de novembro de 2007

perfect Sunday feeling


...e incompleto!!

from Varius multiplex multiformis

But it was still to the liberty of submission, the most difficult of all, that I applied myself most strenuously. I determined to make the best of whatever situation I was in; during my years of dependence my subjection lost its portion of bitterness, and even ignominy, if I learned to accept it as a useful exercise. Whatever I had I chose to have, obliging myself only to possess it totally, and to taste the experience to the full. Thus the most dreary tasks were accomplished with ease as long as I was willing to give myself to them. Whenever an object repelled me, I made it a subject of study, ingeniously compelling myself to extract from it a motive for enjoyment. If faced with something unforeseen or near cause for despair, like an ambush or a storm at sea,


after all measures for the safety of others had been taken, I strove to welcome this hazard, to rejoice in whatever it brought me of the new and unexpected, and thus without shock the ambush or the tempest was incorporated into my plans, or my thoughts. Even in the throes of my worst disaster, I have seen a moment when sheer exhaustion reduced some part of the horror of the experience, and when I made the defeat a thing of my own in being willing to accept it. If ever I am to undergo torture (and illness will doubtless see to that) I cannot be sure of maintaining the impassiveness of a Thrasea, but I shall at least have the resource of resigning myself to my cries. And it is in such a way, with a mixture of reserve and of daring, of submission and revolt carefully concerted, of extreme demand and prudent concession, that I have finally learned to accept myself.


Marguerite Yourcenar: Memoirs of Hadrian
Imagem: J. Miró - Still Life with old shoe

sábado, 24 de novembro de 2007

Nem à própria!



Victor Cauduro Rojas

Calle con ollas (2000) Balance (1999)



Niñera (1993)


Atlas (1998) Dominio del hombre (2001)



La ausente (1991)


Data e Local de Nascimento: 1962 - Cidade do México
Pintor autodidacta com exposições no México, França, Espanha,Canadá, Estados Unidos.
Reside e pinta na cidade de Querétaro, México.

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

FruTos

Tâmara

Pura circunstância trazerem-me
num cesto levíssimo as tâmaras.
Com a boca peso três sílabas.
Com os olhos sou ávida.
Com as mãos repouso e saboreio
os frutos translúcidos.

Fiama Hasse P. Brandão —
Obra Breve





Frutos

Pêssegos, peras, laranjas,
morangos, cerejas, figos,
maçãs, melão, melancia,
ó música dos meus sentidos,
pura delícia da língua;
deixai-me agora falar
do fruto que me fascina,
pelo sabor, pela cor,
pelo aroma das sílabas:
tangerina, tangerina.

Eugénio de Andrade — Aquela Nuvem e Outras

Imagem: Francis Picabia - Uma Mulher Feliz (c.1940)

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Porque..sim

Uma senhora pediu-me
um poema de amor.

Não de amor por ela,
mas «de amor, de amor».

À parte aquelas
trivialidades «minha rosa, lua do meu céu interior»
que podia eu dizer
para ela, a não destinatária,
que não fosse por ela?

Sem objecto, o poema
é uma redacção
dos 100 Modelos
de Cartas de Amor.

Alexandre O'Neill


O amor é o amor - e depois?
Vamos ficar os dois

a imaginar, a imaginar?...

O meu peito contra o teu peito
cortando o mar, cortando o ar.
Num leito
há todo o espaço para amar!

Na nossa carne estamos
sem destino, sem medo, sem pudor,
e trocamos - somos um? somos dois? -
espírito e calor!

O amor é o amor - e depois?

Herberto Hélder - O Amor é o Amor (1960)
Imagem: J. Pollock - Full Fathom-Five, Detail (1947)

J. Pollock - Full Fathom-Five, Full

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Letra Morta



O Tribunal da Relação de Lisboa considerou justificado e legítimo o despedimento de um cozinheiro infectado com HIV que trabalhava na cozinha de um hotel, confirmando decisão semelhante já tomada pelo Tribunal de Trabalho de Lisboa.No acórdão que o PÚBLICO consultou lê-se que "ficou provado que A. é portador de HIV e que este vírus existe no sangue, saliva, suor e lágrimas, podendo ser transmitido no caso de haver derrame de alguns destes fluidos sobre alimentos servidos ou consumidos por quem tenha na boca uma ferida". Por essa razão, os magistrados concluem que se continuasse a ser cozinheiro representaria "um perigo para a saúde pública, nomeadamente dos utentes do restaurante do hotel".

Os três juízes desembargadores que assinam o acórdão da Relação - Filomena Carvalho, José Mateus Cardoso e José Ramalho Pinto (...)



O médico do trabalho do Grupo Sana Hotels deu o funcionário como inapto para a função de cozinheiro depois de saber da sua seropositividade pelo seu médico assistente. O hotel despediu de seguida o funcionário mas afirma que não sabia que era portador de HIV. O parecer do Centro de Direito Biomédico, em Coimbra, sobre o caso nota que pode estar em causa "um caso de violação do sigilo profissional".



Os vários peritos contactados pelo PÚBLICO, tanto médicos como do meio judicial, olham com perplexidade para a decisão e justificação usada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que repete os argumentos do Tribunal de Trabalho de Lisboa.José Vera, responsável pela unidade de tratamento de HIV/sida do Hospital de Cascais, considera que dizer que o suor, lágrimas ou saliva podem transmitir o HIV "é um disparate completo" e demonstra "uma grande ignorância dos juízes e, mais do que isso, quase uma teimosia em permanecer na ignorância". O médico diz mesmo estar-se em presença de "mentalidade da Idade Média" e "preconceito no poder judicial". "O acórdão desprestigia o país e quem o emite."


Qual a cor da indignação?!?

domingo, 18 de novembro de 2007

Est modus in rebus

O presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Rio, liga a iluminação da "maior árvore de Natal da Europa". Fronteiriço à Câmara Municipal, o pinheiro natalício, ofertado à cidade pelo "MillenniumBCP", acende mais de dois milhões de luzes entre as 20 e as 20.30 horas. O acontecimento será acompanhado de um espectáculo piromusical.

"O objectivo é criar uma tradição o Natal começa com o acender da árvore", disse Paulo Fidalgo, director de comunicação do "MillenniumBCP", que patrocina este "fenómeno de uma certa magia social". A partir de hoje, os Aliados serão "uma avenida de peregrinação" de gente do Minho a Coimbra. "Com uma hora de viagem vão ter uma experiência inesquecível". A árvore vai estar, em directo, no sítio da Internet.

"Não é informação oficial, antes uma estimativa, mas os números apontam para um crescimento de 30%", disse Paulo Fidalgo (a propósito de dividendos esperados para os comerciantes da zona)

A árvore de Natal, com 280 toneladas, vai medir a mesma altura que o edifício mais alto do Porto, a Torre dos Clérigos, num total de 76 metros. Iluminará a cidade ‘Invicta’ entre 17 de Novembro e 7 de Janeiro.

in J.N e Correio da Manhã

Estamos...


1) agradecidos 2) mais católicos 3) de candeias acesas

4) perdulários

5) falo/a ciosos 6) orgulhosos 7) imponentes

8) em erecção 9) inolvidáveis 10) na moda

11) mensuráveis 12) patetas das luminárias 13) aqui...ali

14) quais vendilhões do templo 15) no topo 16) em romagem

17) piromusicados 18) à altura 19) a/in fluentes 20) mágicos

21) em estado de graça 22) mais pesados 23) patrocinados

24) natalinos

????????????????????????

sábado, 17 de novembro de 2007

O que é que não se comprava...?


Newman’s Own contará, a partir do próximo ano, com a inclusão de vinhos - Rebel Wine Company - na lista de produtos comercializados. Assim, a partir de Março, California Chardonnay e California Cabernet Sauvignon - ambos de 2006 - poderão ser adquiridos por $16. Os lucros reverterão para a Newman’s Own Foundation, sendo distribuídos por inúmeras instituições de solidariedade social.


Quantos "sobreviveriam" a estes "preparos"?!?

MarÉs

Numa noite em que o céu tinha um brilho mais forte
E em que o sono parecia disposto a não vir
Fui estender-me na praia, sózinho, ao relento
E ali longe do tempo, acabei por dormir

Acordei com o toque suave de um beijo
E uma cara sardenta encheu-me o olhar
Ainda meio a sonhar perguntei-lhe quem era
Ela riu-se e disse baixinho: ....



"Sou a estrela do mar só a ele obedeço
Só ele me conhece, só ele sabe quem sou
No princípio e no fim
Só a ele sou fiel e é ele quem me protege
Quando alguém quer à força
Ser dono de mim..."

Não sei se era maior o desejo ou o espanto
Só sei que por instantes deixei de pensar
Uma chama invisível incendiou-me o peito
Qualquer coisa impossível fez-me acreditar

Em silêncio trocámos segredos e abraços
Inscrevemos no espaço um novo alfabeto
Já passaram mil anos sobre o nosso encontro
Mas mil anos são pouco ou nada para estrela do mar

"Estrela do mar
Só a ele obedeço
Só ele me conhece, só ele sabe quem sou
No princípio e no fim
Só a ele sou fiel e é ele quem me protege
Quando alguém quer à força
Ser dono de mim..."

Jorge Palma
Estrela do Mar, 1984

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Lernen - wozu...? Um...zu...

1940

Mein junger Sohn fragt mich: Soll ich Mathematik lernen?
Wozu, möchte ich sagen. Daß zwei Stücke Brot mehr ist als eines
Das wirst du auch so merken.

Mein junger Sohn fragt mich:Soll ich Französisch lernen?
Wozu, möchte ich sagen. Dieses Reich geht unter. Und
Reibe du nur mit der Hand den Bauch und stöhne
Und man wird dich schon verstehen.

Mein junger Sohn fragt mich: Soll ich Geschichte lernen?
Wozu, möchte ich sagen. Lerne du deinen Kopf in die Erde stecken
Da wirst du vielleicht übrigbleiben.

Ja, lerne Mathematik, sage ich
Lerne Französisch, lerne Geschichte!



Lob des Lernens

Lerne das Einfachste! Für die
Deren Zeit gekommen ist
Ist es nie zu spät!
Lerne das Abc, es genügt nicht, aber
Lerne es! Laß es dich nicht verdrießen!
Fang an! Du mußt alles wissen!
Du mußt die Führung übernehmen.

Lerne, Mann im Asyl!
Lerne, Mann im Gefängnis!
Lerne, Frau in der Küche!
Lerne, Sechzigjährige!
Du mußt die Führung übernehmen.
Suche die Schule auf, Obdachloser!
Verschaffe dir Wissen, Frierender!
Hungriger, greif nach dem Buch: es ist eine Waffe.
Du mußt die Führung übernehmen.

Scheue dich nicht zu fragen, Genosse!
Laß dir nichts einreden
Sieh selber nach!
Was du nicht selber weißt
Weißt du nicht.
Prüfe die Rechnung
Du mußt sie bezahlen.
Lege den Finger auf jeden Posten
Frage: Wie kommt er hierher?
Du mußt die Führung übernehmen.

Ich habe gehört, ihr wollt nichts lernen

Ich habe gehört, ihr wollt nichts lernen
Daraus entnehme ich: ihr seid Millionäre.
Eure Zukunft ist gesichert - sie liegt
Vor euch im Licht. Eure Eltern
Haben dafür gesorgt, daß eure Füße
An keinen Stein stoßen. Da mußt du
Nichts lernen. So wie du bist
Kannst du bleiben.

Sollte es dann noch Schwierigkeiten geben,
Da doch die Zeiten
Wie ich gehört habe, unsicher sind
Hast du deine Führer, die dir genau sagen
Was du zu machen hast, damit es euch gut geht.
Sie haben nachgelesen bei denen
Welche die Wahrheiten wissen
Die für alle Zeiten Gültigkeit haben
Und die Rezepte, die immer helfen.

Wo so viele für dich sind
Brauchst du keinen Finger zu rühren.
Freilich, wenn es anders wäre
Müßtest du lernen.

Bertolt Brecht
Imagem: H. Matisse
La leçon de musique (1917)
La leçon de piano

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Amadeo de Souza-Cardoso

Manhufe, 14 de Novembro de 1887
Espinho, 25 de Outubro de 1918

1 2
3
4
5

6 7 8

9

Imagens:
1-Cabeça(1913)
2-Les Cavaliers (1913)
3-A Menina dos Cravos (1913)
4-Os Barcos (1913)
5-Cozinha da Casa de Manhouce (1913)
6-Pintura (1914)
7-Canção Popular a Russa e o Fígaro (1916)
8-Par Ímpar (1916)
9-Pintura (1917)

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Demandas

Uma certa quantidade de gente à procura
de gente à procura duma certa quantidade

Soma:
uma paisagem extremamente à procura
o problema da luz (adrede ligado ao problema da vergonha)
e o problema do quarto-atelier-avião

Entretanto
e justamente quando
já não eram precisos
apareceram os poetas à procura
e a querer multiplicar tudo por dez
má raça que eles têm
ou muito inteligentes ou muito estúpidos
pois uma e outra coisa eles são
Jesus Aristóteles Platão
abrem o mapa:
dói aqui
dói acolá

E resulta que também estes andavam à procura
duma certa quantidade de gente
que saía à procura mas por outras bandas
bandas que por seu turno também procuravam imenso
um jeito certo de andar à procura deles
visto todos buscarem quem andasse
incautamente por ali a procurar

Que susto se de repente alguém a sério encontrasse
que certo se esse alguém fosse um adolescente
como se é uma nuvem um atelier um astro


Mário Cesariny

Imagem: J. Miró
The Escape Ladder (1939/40)

domingo, 11 de novembro de 2007

Ab Antiquo

Preâmbulo às instruções para dar corda ao relógio

Pensa nisto: quando te oferecem um relógio, oferecem-te um pequeno inferno florido, uma prisão de rosas, um calabouço de ar. Não te dão somente o relógio, muitos parabéns, que te dure muitos e bons, é uma óptima marca, suíço com não sei quantos rubis, não te oferecem somente esse pequeno pedreiro que prenderás ao pulso e passeará contigo. Oferecem-te -- ignoram-no, é terrível ignorá-lo -- um novo bocado frágil e precário de ti mesmo, algo que é teu mas não é o teu corpo, que tens de prender ao teu corpo com uma correia, como um bracito desesperado pendente do pulso. Oferecem-te a necessidade de lhe dar corda todos os dias, a obrigação de dar corda para que continue a ser um relógio; oferecem-te a obsessão de ver as horas certas nas montras das joalharias, o sinal horário na rádio, o serviço telefónico. Oferecem-te o medo de o perder, de seres roubado, de que caia ao chão e se parta. Oferecem-te uma marca, a convicção de que é uma marca superior às outras, oferecem-te a tentação de comparares o teu com os outros relógios. Não te oferecem um relógio, és tu o oferecido, a ti oferecem para o nascimento do relógio.

Instruções para dar corda ao relógio

Lá bem no fundo está a morte, mas não tenha medo. Segure o relógio com uma mão, com dois dedos na roda da corda, suavemente faça-a rodar. Um outro tempo começa, perdem as árvores as folhas, os barcos voam, como um leque enche-se o tempo de si mesmo, dele brotam o ar, a brisa da terra, a sombra de uma mulher, o perfume do pão.

Quer mais alguma coisa? Aperte-o ao pulso, deixe-o correr em liberdade, imite-o sôfrego. O medo enferruja as rodas, tudo o que se poderia alcançar e foi esquecido vai corroer as velas do relógio, gangrenando o frio sangue dos seus pequenos rubis. E lá bem no fundo está a morte, se não corrermos e chegarmos antes para compreender que já não interessa nada.

Julio Cortázar
Imagens: René Magritte
La Voie Royale
Le temps traversé